Brasil eliminado da Copa: surpresa?



Mais uma vez o fantasma das quartas de final apareceu no Catar e a seleção brasileira foi eliminada pela Croácia nos pênaltis. Desde 2002 a seleção foi eliminada em quatro oportunidades nas quartas de final e uma vez na semifinal, o histórico 7 a 1 contra a Alemanha.

Entre 1970 e 1994 o cenário foi um pouco melhor. Considerando que em 1974 e 1978, apesar do finalista ter sido definido em um grupo de 4 seleções, o Brasil disputou a liderança até a última rodada, podendo ser considerado duas eliminações numa semifinal. Além disso foram duas eliminações em quartas de final (1982 e 1986) e uma nas oitavas (1990).

O Brasil ganhou 5 copas das 22 já disputadas. Isso significa uma média de uma conquista a cada 4,4 Copas. Caso esta média fosse distribuída durante as 22 edições do mundial a seleção brasileira teria vencido as Copas de 1950, 1970, 1986, 2006 e 2022. 

Como a última edição conquistada pelo Brasil foi em 2002, pela média histórica a edição do Catar seria a conquista do hexa, pois faz 20 anos da última conquista. Portanto, a seleção brasileira saiu da média estatística em 2022.

As 22 Copas foram disputadas em 8 décadas e as conquistas da seleção brasileira se concentraram em duas décadas (58 a 70 e 94 a 2002). Partindo desse dado, é possível verificar que, das 8 gerações de jogadores brasileiros,  apenas 2 a 3 gerações foram responsáveis pelas conquistas. Esse dado traz um questionamento: 

Apesar do Brasil ser um dos maiores produtores de jogadores de futebol em termos de quantidade e qualidade, apenas gerações muito especiais são as responsáveis para conquistar as Copas?

Partindo do pressuposto que apenas gerações especiais são responsáveis pelas conquistas, proponho as seguintes hipóteses como possíveis motivos que levaram às conquistas:

1) Diferencial técnico

Nas conquistas entre 1958 e 1962 haviam vários jogadores brasileiros que eram os melhores em suas respectivas posições, somando qualidade e experiência como Nilton Santos e Didi com a qualidade e juventude de Pelé e Garrincha. Em 1970 a  qualidade e experiência tinha em Pelé, Gerson, Tostão e Carlos Alberto suas referências e a qualidade e a juventude vinha de Jairzinho, Rivellino e Clodoaldo.

Na geração do tetra a qualidade e experiência vinha de Romário, Bebeto, Taffarel, Dunga e Branco e não houve a presença de jovens promissores no time titular. Em 2002 a  qualidade e experiência vinha Cafu, Roberto Carlos, Ronaldo e Rivaldo somado a qualidade e a juventude de Ronaldinho Gaúcho. 

Uma forma de medir o diferencial técnico é conferir os jogadores vencedores da Bola de Ouro da revista France Football. Até os anos 80 apenas europeus foram os premiados. Com a concentração dos principais jogadores do mundo nos clubes europeus, à partir da década de 1990 começaram as ser premiados jogadores de outros continentes.

Ronaldo, Rivaldo, Ronaldinho Gaúcho e Kaká, vencedores da Copa de 2002 foram premiados e, desde 2007, não houve mais nenhum jogador brasileiro premiado. Sinal que o diferencial técnico brasileiro deixou de ser reconhecido nessa premiação.

Pela premiação da Fifa, Romário, Ronaldo, Rivaldo, Ronaldinho Gaúcho, e Kaká foram premiados e, como no prêmio da France Football, desde 2007 não houve mais nenhum brasileiro vencedor. Neymar em 2017 ficou na terceira posição.

Outra fonte para avaliação é a seleção anual da Fifa. Até 2008 os meias brasileiros como Kaká e Ronaldinho Gaúcho fizeram parte das seleções. De 2009 até 2021 apenas defensores brasileiros fizeram parte da seleção (Lúcio, Daniel Alves, Maicon, Marcelo, Thiago Silva, David Luiz e Allison). A única exceção foi Neymar em 2017.

Esses dados demonstram a queda do diferencial técnico no meio campo e no ataque das duas últimas gerações.

2) Jogadores de clubes do exterior

De 1990 até 2002 a média de jogadores convocados de clubes do exterior era de aproximadamente de 50% dos convocados. A partir de 2006 houve um forte incremente, com 90% dos convocados proveniente de clubes do exterior.

Além desse fato, também a partir de 2006 o número de jogadores com mais tempo de carreira no exterior do que no futebol brasileiro deu um grande salto. Em 2006 saltou de 5 para 9 atletas. Já em 2018 foram 19 atletas com mais tempo de carreira no exterior, em 2022 foram 21 atletas.

3) Inovação tática

A seleção de 1958 inovou ao começar a trabalhar no sistema tático 4-3-3, ao invés do tradicional 4-2-4 da época. Zagallo era o responsável de voltar ao meio campo, ganhando mais um jogador para trabalhar a bola, congestionar o meio campo e ajudar a marcação defensiva. Além disso foi possível verificar as subidas ao ataque do lateral Nilton Santos, algo que também não era comum na época para os laterais.

Em 1962 esse sistema praticamente foi repetido e em 1970, com algumas variações, o mesmo sistema foi utilizado, com Rivellino fazendo a função de Zagallo.

Em 1994 também houve uma inovação, com o famoso losango do 4-3-1-2, com dois atacantes artilheiros e móveis, que virou uma tendência no Brasil, com famosas duplas de ataque nos clubes brasileiros. O diferencial tático, somada a um melhor vigor físico foram um diferencial, que de certa forma foi repetido em 1998 e 2002.

Após essas inovações não houve mais nenhum diferencial tático criado pelos treinadores do futebol brasileiro. Com o conhecimento cada vez mais globalizado e democrático, o acesso à informação está disponível para todos os treinadores. Outro ponto a ser observado é a presença de treinadores estrangeiros se destacando nos clubes brasileiros, demonstrando que há uma entressafra de treinadores no país. Em 2023, dez clubes da séria A iniciam a temporada com treinador estrangeiro.


Em resumo, as três hipóteses estão ligadas aos treinadores, qualidade dos jogadores e uma liga mais forte financeiramente para que mais jogadores da liga brasileira tenham maior presença entre os convocados e serem um fator diferencial em jogos contra outas escolas.

O sucesso de treinadores estrangeiros no Brasil desde 2019 é um sinal que o nível dos treinadores brasileiros está sob questionamento, tanto que, pela primeira vez, há uma possibilidade de um estrangeiro ser cogitado para ser o treinador da seleção.

Na questão da qualidade dos jogadores, um sinal de uma possível queda são as participações no mundial e no sul-americano sub 20. Desde 2011 a seleção brasileira não vence nenhum dos dois torneios. Tirando o vice-campeonato de 2015, o Brasil não se classificou para os mundiais de 2013, 2017 e 2019.

São em momentos como as eliminações que os comandantes do futebol brasileiro deveriam refletir quais os acertos e os erros para fazer as correções para o ciclo da próxima Copa e também para longo prazo.

Desta forma uma eliminação pode ser até uma surpresa mas, com planejamento de longo prazo, as surpresas seriam minimizadas, com maior protagonismo do futebol brasileiro, não apenas na Copa do Mundo, mas também em nível de clubes.





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